domingo, 21 de junho de 2009






DESMUNDO

Assisti há alguns dias um comercial do Greenpeace que hipotetizava como seria a vida na terra no ano de 2100 caso os seres humanos aprendessem a conviver em harmonia com o meio ambiente e fizessem uso apenas de combustíveis não degradáveis aos ecossistemas. Mostrava que as geleiras dos pólos não haviam derretido, mais nenhuma espécie animal havia se extinguido, as florestas (principalmente a Amazônica) ainda estavam de pé e o aquecimento global não mais assustava a raça humana. A parte as mudanças climáticas, das espécies ou das florestas, pela primeira vez pensei que era possível viver até 2100.

Caso viva até o século XXII, terei 113 anos na sua virada – algo possível. Estranho como nunca pensara viver tanto tempo, nunca pensara um dia poder vir a ser tataravô, ou mesmo, pronunciara a expressão “século vinte e dois”. Estamos muito mais acostumados a crer que tudo pode se acabar amanhã a sonhar em viver até 2100. Porque nunca me dera o luxo de planejar uma vida 90 anos além dos vinte e poucos já vividos?

A raça humana está sendo codificada a não ter esperança num próximo século, muito menos que naquele século, possam existir lugares pacíficos de se viver. A todo instante o que é martelado em nossas retinas e ouvidos já tão cansados, é que as mudanças climáticas tornarão o clima insuportável em poucos anos; o nível dos mares se elevará a ponto de arrancar do mapa muitas cidades litorâneas; o verde inexistirá frente ao cinza; o terrorismo matará boa parte dos homens e mulheres do mundo; vírus e bactérias mortais extinguirão os seres humanos pouco a pouco e que, 2050 já é lucro para quem vira a casa dos 30 hoje em dia.

Acredito que seja muito provável que assistiremos o noticiário do ano de 2050, dando a notícia da existência de pessoas com 140, 150 anos de idade. Lembremos que já houve, nos dias de hoje, quem tenha vivido até os 130. Isso com a medicina muito mais falha que a de hoje, o mundo habitado por menos da metade da população há um século e guerras que mataram milhões. No ano de 2100, a tendência mundial é de existirem próximo de 10 bilhões de habitantes, não é possível que um único cidadão não viva até os 150, ainda que a fisiologia do corpo humano prove que isso seja quase impossível.

Quando se pensa em tudo isso e leva-se para o lado pessoal, os números podem apavorar ou tranqüilizar os mais afoitos. Pensemos: se eu ainda tiver mais 90 anos de vida e viver em um mundo com mais dez bilhões de pessoas, o que é, hoje, algo ou alguém em minha vida? Às vezes achamos que o mundo acabou porque perdemos alguém importante, porque fomos demitidos de um emprego ou simplesmente achamos que o fim está próximo porque cruzamos a qüinquagésima primavera.

Há muito mais para se viver, muito mais para se conhecer, muitos mais amores para se amar, tombos para cair, forças para reerguer-se, dia-a-dia. Há necessidade de desistir de um sonho, sempre quando se constata que, aquele sonho, não nos completará plenamente. É preciso força para dizer adeus e para partir! Caminhos que levem para longe quando a mesmice de onde estamos desfizer mais e mais sorrisos.

E sempre que pensarmos em desistir da vida ou que a vida nos obrigue a desistir dela, lembremos: não é possível que até 2100, com 10 bilhões de pessoas no mundo, “um dia” ou “alguém”, não esteja ao meu lado me dando a mão e me reerguendo dos meus tombos e refazendo comigo sonhos que jurava serem a solução de uma vida, mas que, posteriormente, viu-se não passarem de um sonho.

É corriqueiro da mente humana, achar que tudo que havia no passado era mais saudável, bonito e puro. Pode até ser que assim fosse, mas, talvez o tempo presente (que após vivido será passado) SEJA um divisor de águas entre o que foi bom, alcançou o ápice do desgaste e retomou o caminho da sustentabilidade e harmonia entre os povos. Sonho de um pobre autor, querido leitor? O tempo dirá! Sonho sendo, desisto dele e faço novos planos de conseguir sobreviver até 2030 num mundo que caminha a passos largos para o desmundo.


THIAGO ROCHA




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segunda-feira, 15 de junho de 2009


MEL ESCARLATE



Quando a abelha picou o menino

Nada ele fez

Não chorou

Não gritou

Não fez sequer uma reação que exacerbasse a sua dor

A engoliu feito faca amolada, rasgando as entranhas

quieto.


Perante o ser inanimado

Que observava astuto seu movimento alado

Estático, tal folha seca no ar outono

A abelha não exitou em cravar sua espada.


MOVIMENTOS PÉRFURO-CORTANTES

pele seda

ESTILETE / papel / CATAPULTA / cervical / MOTOSSERRA / floema

LUZ / copo de cachaça na mesa do bar no domingo.


E foram tantos golpes de esgrima

Sem escudo, sem armadura

Que a rosa vermelha brotou entre o jardim

Que dos olhos céu aberto fez-se chuva

Que da morfina sentiu-se o infarto

E o bípede, implodiu ápide ao solo.


Ao observar o triunfo sobre Golias

do pequeno Davi que flutuava Euller no vento

O exército de espadas negras se aproximou

E o ataque foi atroz

Cada instante mais soldados,

mais espadas, mais kamikazes, mais exércitos e muito

Muito mais rosas vermelhas a nascer.


De olhos abertos

Aquele gigante de gesso mumificava seu desespero

Um simples gemido não era ouvido do pequeno estátua.


Ao notar a criança observando,

ainda com o sorriso no rosto,

a aproximação silenciosa da morte

A primeira das abelhas sussurrou-lhe ao ouvido:

- Por que não reage menino?

- O que se passa contigo?


Aquele que ainda brincava na rua e

trepava na jaqueira do quintal

Sorriu parnasiano, e declamou trovador

seu pequenino amor infinito:


“Quando regestes a mim o teu som

Cintilando-me as asas, sublime

Foi como som de orquestra entoada

O dissílabo nome de minha Ísis amada“.


Sem nada entender, o inseto decolou

Desenhando no ar amarelo

As últimas palavras da vida daquele menino.


Zzzz Zzzz Zzzz


Zziii Zziii Ziii


Isis Isis Isis


Isis...


THIAGO ROCHA




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quinta-feira, 11 de junho de 2009





ORIGAMI


Nosso amor é como um velho oriental

a criar seu origami


Eu te amasso

te dobro

te corto

te rasgo

te aliso e te desfaço

Refaço ao passo do meu tato


Pra depois te admirar.



THIAGO ROCHA



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